22 novembro 2008

O Cânon do Novo Testamento




Introdução

O Cânon do Novo Testamento é um dos 'pacotes' cristãos que herdamos dos que nos antecederam. Grandes esforços foram despendidos da parte de cristãos sinceros dedicados ao Senhor de todos nós, Jesus, bem letrados na Palavra, e profundamente preocupados com a saúde da doutrina que Cristo Jesus nos deixara.
É ainda comum se pensar que o conjunto de livros sagrados considerados inspirados por Deus, foi entregue à humanidade na forma e ordem em que se encontram na Bíblia, hoje. Esta visão romântica da Bíblia limita o conhecimento, e por conseguinte, limita o crescimento do povo cristão dos nossos dias. Em se tratando do Novo Testamento, isso se dá, basicamente, em razão de os que lideram o grande rebanho, desconhecer as nuances da formação desse cânon, privando os irmãos de ter esse contato maravilhoso com a história dos seus irmãos desta grande família.

Dinâmica

A organização dos livros do Novo Testamento levou mais de trezentos anos para ser definida. Nesse ínterim, irmãos vários doaram até suas próprias vidas para manter em existência todo esse material escrito. Eles os reproduziam, e os espalhavam às comunidades cristãs dispersas nas várias regiões do mundo antigo. Eles os liam nas 'igrejas', e procuravam guardá-los em lugar seguro em tempos de perseguição.
Esses documentos: livros, cartas, homilias e tratados, existiam em abundância; não se resumiam aos vinte e sete que temos hoje. Vários documentos que carregavam os nomes dos apóstolos e de outros importantes servos do Senhor, surgiram na época da Igreja Primitiva (até aproximadamente 400 d.C). Isso acontecia, principalmente, em virtude de alguns homens, até mesmo sinceros cristãos, ao escrever um documento, assumir o nome de alguém proeminente para que o tal documento circulasse livremente e com autoridade. Sua preocupação maior era a de garantir que a sua doutrina ou pensamento fosse levado à diante.

Início da Organização do Cânon

A proliferação desses documentos, alguns com ensinamentos notoriamente maléficos à doutrina cristã, provocou a necessidade de se definir quais documentos deveriam ser considerados sãos para os cristãos. Além disso, o edito do imperador Diocleciano que ordenava a queima de todo livro sagrado, de certa forma, intensificou a urgência em se estabelecer um rol definitivo para os livros sagrados. Assim sendo, homens santos se reuniram para essa árdua tarefa. A questão maior era: como decidir se tal livro é, ou não, inspirado por Deus? Desde muito cedo (~150 d.C) começaram a surgir listas e catálogos que traziam a relação dos livros lidos comumente nas 'igrejas' e tidos como inspirados por Deus. Foram então estabelecidos os seguintes critérios para a análise desses documentos:

Apostolicidade: O documento foi escrito por um apóstolo, alguém que viu Jesus e andou com Ele? Se não, teve o autor íntima relação com um apóstolo (exemplos aceitos na época: Marcos e Lucas)?
Conteúdo: A mensagem que o documento traz está de acordo com os ensinamentos das Escrituras, i.e., o Antigo Testamento? Possui conteúdo espiritual e relevante para a vida cristã? Carrega a Doutrina ensina pelo Salvador Jesus Cristo?
Universalidade: O livro foi aceito pelos primeiros cristãos como proveitoso? era comumente lido nos primeiros ajuntamentos cristãos?
Se a resposta fosse 'sim' para esses pré-requisitos, o documento era incluído no cânon que estava sendo formado. Esses critérios eram observados por representantes de várias comunidades cristãs da época, os livros eram cuidadosamente examinados e sua história verificada para se saber da sua autenticidade.

Os Documentos

Alguns documentos (em breve disponibilizarei a íntegra de cada um deles nesta página, na seção Documentos Anteigos) que gozaram de lugar nas primeiras listas (e que acabaram sendo retirados dela) foram:

I Clemente: Primeira epístola de Clemente Romano (~96 d.C.) aos Coríntios. Clemente foi, possivelmente, um dos companheiros de Paulo em suas jornadas (Fl. 4:3). Nesta epístola, Ele exorta a comunidade a acalmar os seus ânimos exaltados e a por fim aos conflitos que criaram, pois não são dignos de Cristo; isso ele faz com muita beleza. A carta sempre obteve alta estima entre os cristãos, e é muitíssimo útil ao cristão honesto. É lamentável que hoje pouquíssimos tenham acesso a esse material tão proveitoso a todos nós. A segunda epístola de Clemente (II Clemente) apesar de ser encontrada, juntamente com I Clemente, no Codex Alexandrinus, raramente foi tida como autêntica.
O Pastor: Provavelmente escrito por Hermas (~140 d.C.), companheiro de Paulo em suas viagens (Rm. 16:14), é um documento universal, com caráter apocalíptico. Muitíssimo querido pelos primeiros cristãos, este documento foi tido por inspirado por muitos. Hoje, porém, ainda que é de valor inestimável para nós, o livro é quase totalmente desconhecido da comunidade cristã dos nossos dias.
Epístola de Barnabé: Descoberta recentemente (séc. IX), a epístola de Barnabé (~130 d.C), companheiro de Paulo (ainda que hoje, poucos concordam que tenha sido o próprio Barnabé, seu autor), possui um tom veloz e firme, mesmo tendo estilo pobre, sua posição com relação a Cristo é gloriosa, e suas interpretações do Antigo Testamento são inspiradoras. Gozou de autenticidade por alguns proeminentes pais da igreja durante os primeiros séculos.
Didaque (O ensino dos doze Apóstolos): Esse documento, muito proveitoso e útil a qualquer cristão sincero, esteve também na categoria de "livro sagrado" por muito tempo. Sua circulação era comum entre os primeiros cristãos, era também muito estimado.
Houve ainda outros documentos que carregavam os nomes dos apóstolos. Apesar de serem lidos por algumas comunidades, nunca gozaram da condição de livros sagrados, por apresentar divergências nítidas com as Escrituras estabelecidas, e por ser muito fantasiosos:

O Apocalipse de Pedro
Atos de Paulo
O Evangelho de Pedro, e outros
Há, em nosso cânon (o Novo Testamento), livros que encontraram muita dificuldade para fazer parte dele. Alguns, até hoje são disputados quanto a sua autenticidade (falarei resumidamente de cada um nesta página, na seção Estudos Bíblicos):

Epístola aos Hebreus: apostolicidade (autor desconhecido).
Epístola de Tiago: apostolicidade (provável pseudoepígrafe), conteúdo (clara divergência com o ensino da justificação unicamente pela fé), e universalidade (uso improvável pelos primeiros cristãos)
II Epístola de Pedro: apostolicidade (provável pseudoepígrafe), e universalidade (uso improvável pelos primeiros cristãos).
II e III Epístolas de João: apostolicidade.
Epístola de Judas: apostolicidade (provável pseudoepígrafe), e conteúdo (menciona livros apócrifos (de certa forma, conferindo-lhes autoridade): Ascensão de Moisés e Enoque).
Apocalipse de João: apostolicidade e conteúdo
Foi no Concílio de Cartago (397) que a primeira lista com os livros inspirados do Novo Testamento (com os vinte e sete livros que temos hoje) foi acolhida.

Conclusão

Certamente o Espírito de Deus, que inspirou nos escritores sagrados a mensagem de Deus, guiou também aqueles sobre cujos ombros repousou a responsabilidade da análise e seleção de todo esse material que hoje dispomos como o Novo Testamento. Não devemos, entretanto, banir do nosso meio aqueles documentos que, ainda que não gozam do privilégio de fazer parte do nosso atual Cânon, possuem ensinamentos úteis e proveitosos a nossa vida cristã.

Tendo diretrizes acertadas, a Igreja de Jesus seguramente ganhará com o conhecimento desse material, também pertencente aos primeiros cristãos. Talvez, Paulo, em I Tessalonicenses 5:19-21, fortaleça esse conselho: 19 Não extingais o Espírito; 20 não desprezeis as profecias, 21 mas ponde tudo à prova. Retende o que é bom.

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